Ildegardo Alencar
I
Serras... Serras... Serras
Araripe
Das entranhas de pedra
Saiu meu grito de parto
E como fio d’água
Há séculos
Projetei-me prá vida
Escrevi meu dorso
De areias, rochas e barros
A caminho das grandes águas !
Séculos !
Séculos !
Séculos !
Senhor dos vales Cariris
A cantar nas minhas verdes águas
A canção dos remansos
No segredo dos peixes!!!
Desde a manhã do Gênesis
Vivi no meu leito
Entre as matas
E cantigas de pássaros
Encantavam-me os mergulhos
Dos curumins tapuias
E o flerte à distância
Das montanhas verdes-azuis
De Quincuncá
II
O vento matutino
Segreda notícias
De mares distantes
De terras distantes
De caravelas
Chegando
Com homens armados
O solo ocupando
Ah... curumins tapuias
De medo
Assustados
As serras procurando
Meu correr sereno
Testemunha
As mudanças
Nos índios
Nas matas
III
Sesmaria....
Terra dividida
Natureza ferida
E uma imagem
Diferente
Formando-se ao redor.
Meu canto
De águas
Misturam-se
Ao lamento
Das árvores caídas
Dos passarinhos fugidios !...
Mas acolho as botas
Que desbravam
E do meu leito
Saem água
E peixes
Alimentando
A alma desbravadora
Com o silêncio complacente
Das serra e vales
Araripe
Cariris
E Quincuncá
IV
Quixará
Na curva sinuosa
Do meu caminho
Entre as serras
Surgindo da bruma
A me enamorar
Caminho de pedras
E os pés de benjamins
Se convertendo em moradias
De todas as andorinhas
Matriz da Conceição
O primeiro
Badalar dos sinos
De teu campanário
Foi a carícia suave do vento
Que me acordou
Pr’as mudanças que haviam de vir
E a canoa de “Seu Beija”
Com seu vermelhão de zinco
Carícia temporária
Nas águas de inverno
Que aproximava
A cidade e a serra
Até hoje me presenteia a vida
Com o entardecer
Mais bonito
Que todos os sóis
De todos os tempos
Ainda produzem
V
Um dia ...
Quixará foi guardado
Nas gavetas da História
E Nasceu Farias Brito
Que minhas águas
De inverno
Abraçou c’o mesmo amor
VI
As minas de cal
Salgavam a vida
E o algodão
Nas montanhas
Receberam a luz
Que vieram nos fios
Trazidos de outro rio
Para iluminar minhas noites quentes
VII
Como beijei nos barrancos
As mangas maduras
Caindo dos galhos
Se misturando aos genipapos
VIII
Farias Brito
Acompanho
O teu andar no tempo
E de ti
- dos teus filhos
Colhi lágrimas e sangue
Sepultei no meu poço
- Poço do Padre
O sopro de vida
Do teu sacerdote
Jovem em flor
Assisti as secas
Que nos maltratava
E nos privava:
Eu de águas
E teus filhos
De safra e comida
Na abundância
De teus baixios
Quantas vezes acariciei
Tuas cabeleiras de arroz!
Assisti o teu crescer
E meu diminuir !!!!!
Mas a natureza
Nos cobra viver juntos
Em harmonia
Com todos os elementos
Que a compõe
IX
Hoje agonizo !!!!!!
Saudade das matas
De minhas várzeas
Sobrevivo nos poços tristes
Que resmungam a lembrança
Das correntezas!...
X
Farias Brito...
Convoca teus filhos a me ressuscitar !!!
De volta as mangueiras e genipapos...
XI
O amor que em ti encontro
É o chamado cotidiano pra vida
Trarei de volta as borboletas
Os arrozais
Os bois
O sorrido de todas as crianças
Na paz alimentada
De teu povo simples
XII
Farias Brito... Farias Brito ...
Ainda menina
Adolescência em flor
Teu nome é ternura
Teu viver em mim
Puro amor !!!
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Esta poesia foi é de autoria de Ildegardo Alencar ( filho de Seu Zequinha) e está sendo trabalhada pelo grupo de teatro do Centro Cultural. Já esteve em cartaz por duas vezes.
Colaborou: Cícero Menezes
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